02 outubro, 2009

Em Terra de Loucos

“Em terra de Loucos, quem tem Juízo é Louco!”, assim concluiu Mário de Sá Carneiro no seu livro Loucura, assim começo eu neste texto do qual ainda nada sei.

Foi nesta frase que passei grande parte do meu dia a matutar, não por não a compreender ou tanto menos por me causar estranheza, mas por me soar a tão familiar, embora até hoje me fosse completamente alheia.
Não foram poucas a vezes que me deparei com esta questão: O que é realmente a Loucura?
Também não é a primeira vez que me dou a divagações escritas sobre o mesmo assunto, mas nunca me ocorreu descrevê-lo tão bem como Mário de Sá carneiro o fez há cerca de 100 anos atrás:

“Loucura?! – Mas afinal o que vem a ser a Loucura?...
Um enigma… Por isso mesmo é que às pessoas enigmáticas, incompreensíveis, se dá o nome de loucos…
Que a loucura, no fundo, é como tantas outras, umas questão de maioria. A vida é uma convenção: isto é vermelho, aquilo é branco, unicamente porque se determinou chamar à cor disto vermelho e à cor daquilo branco. A maior parte dos homens adoptou um sistema determinado de convenções:
É a gente de juízo…
Pelo contrário, um número reduzido de indivíduos vê os objectos com outros olhos, chama-lhes outros nomes, pensa de maneira diferente, encara a vida de modo diverso. Como estão em minoria… são doidos…
Se um dia porém a sorte favorecesse os loucos, se o seu número fosse superior e o género da sua loucura idêntico, eles é que passariam a ser os ajuizados: Na terra dos cegos, quem tem um olho é rei, diz o adágio: na terra dos doidos, quem tem juízo, é doido, concluo eu.”

Podia certamente ficar por aqui e não acrescentar mais nada, no entanto as minhas divagações não mo permitem e se assim não fosse de pouco me serviria transcrever tão brilhante dissertação.

Da amálgama, na sua generalidade disforme, de pensamentos que me percorreram a mente após a leitura do que anteriormente citei, houve alguns que tomaram forma e são esses mesmos que vou tentar exprimir, na certeza porém de que o farei com inferior brilhantismo.

É um facto que a sociedade, a maioria portanto, não vê com bons olhos os loucos, no entanto, julgo, que por vezes o faz, o fazemos, o faço, por pura inveja! Inveja de não ter coragem de revelar o que realmente nos vai na alma!
Quem não gostaria de por vezes lançar bem alto um grito no meio da rua? Um grito de revolta! Um grito de pranto! Um grito de alegria! Um simples grito apenas pelo gozo de o dar! O que seja…
Quantos de nós o fazemos? Muito poucos… talvez os nossos amigos mais loucos…

A sociedade não é mais que um grupo de pessoas a representar e nesta peça de teatro os loucos são simplesmente maus actores. Actores sem formação, ou mesmo sem jeito para representar. E por norma os maus actores não são aplaudidos pela plateia, mas se por acaso houver no meio dessa plateia um que esboce uma palma, é louco!

Todos representamos, todos encenamos, todos criamos a nossa personagem que acabamos por apresentar no palco enorme que é a vida nesta sociedade, onde toda uma plateia se dispõe para nos julgar, com o maior dos rigores, à mínima falha e a nossa personagem é dilacerada pela plateia, por este júri de nossos pares.
Aos que se recusam a entrar na peça, a esses está fadado o desprezo, aos que representam mal é-lhes dado um papel de figurante, aos que melhor representam é-lhes dado o papel principal, o de cidadão exemplar!

Será que não vivemos já numa terra de loucos? Onde afinal quem tem juízo é o Louco?
Seremos todos tão animalescos e selvagens ou inaceitáveis aos olhos dos nossos pares que tenhamos que criar este circo decadente para convivermos uns com os outros?
Ou temos nós próprios, no nosso íntimo, medo, falta de coragem de mostrar quem realmente somos, sob pena de podermos vir a ser colocados na borda do prato?
Porque queremos afinal que a sociedade nos engula?
E porque engolimos nós esta sociedade e todas as convenções que esta acarreta e nos impõe?
Será a sociedade não mais que um pacto de não agressão entre os habitantes deste mundo?
E se o é, será que toda esta destruição, guerra e aniquilação só cessará no dia em que todos formos absorvidos pelo mesmo ideal de sociedade?

Neste momento são mais as questões, que as resposta, o que me vai na mente.
Não espero pelas respostas, quem sabe quando elas virão? …
E espero também parar em breve com toda esta divagação, corro o risco de ficar Louco! HC

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