23 março, 2004

Mundo

Chego a casa. Sento-me no sofá. Ligo a televisão. Vejo as notícias.
Vejo a Natureza a morrer. Vejo a poluição que continuamos estupidamente a fazer, comprometendo o futuro dos vindouros. Vejo o consumo inconsciente dos recursos naturais como se não houvesse amanhã. Vejo a extinção de inúmeras espécies diariamente, provocada pela falta de escrúpulos do Homem. Vejo as cidades a aumentar. Vejo o fim de valores inestimáveis.
Vejo a pobreza, vejo a riqueza, vejo a desigualdade.
Vejo a ganância, a sede de poder (mas o que é o poder afinal?). Vejo o atropelamento desumano numa guerra de interesses. Vejo fome de dinheiro, o tentar acumular o máximo de dinheiro possível, e para quê? Para pagar um lugar no paraíso? Não é o que se amealha que conta, é o que se dá.
Vejo crianças a morrer à fome, a morrer à sede, povos inteiros num sofrimento prolongado. Vejo camiões inteiros com comida para se deitar fora. Porque não se dá a quem não pode comprar? Provoca um desequilíbrio no mercado, diz-se. Não é óbvio?
Vejo “Very Important Person”s que nunca fizeram nada na vida, que são ricos porque são, que são tudo menos importantes, que são nada. Aproveitam a sorte (?) que tiveram unicamente para benefício próprio, para a fama, para vidas luxuosas, inúteis. E os que tiveram menos sorte? Melhor sorte para a próxima.
Vejo terrorismo. Vejo pessoas a morrer em directo. Vejo entrevistas às famílias de quem morre: “Descreva-nos a sua dor!”. E a dor deles é o nosso entretém. E vamos ficando como que adormecidos, como que anestesiados. Vamos deixando de sentir.
Vejo gente sem escrúpulos que se aproveita da fraqueza dos pequenos, dos ignorantes, e em nome da religião os levam a praticar o desumano. E este fanatismo religioso não salva. Só destrói.
Mudo de canal.
Vejo o flagelo da droga. Vejo o flagelo da SIDA. Vejo a impotência face ao cancro.
Vejo a guerra em directo. Vejo as tácticas ao pormenor. Sigo tudo a par e passo. Vejo a morte outra vez. Já não me choca...
Vejo a prostituição física. Vejo a prostituição moral. Gente que se vende por dinheiro. Uns porque não têm nada e outros porque querem mais. E mais. E mais…
Vejo o amor a desaparecer. Vejo a vulgarização do sexo. Esfregam-me na cara pornografia gratuitamente à hora do jantar.
Vejo pederastas que vão sendo descobertos com a certeza que muitos mais andam à solta. Esfregam-me na cara imagens chocantes de crianças (outra vez as crianças).
Esfregam-me na cara as imagens dum mundo em putrefacção, cada vez mais podre. E vejo-me a mim sem réstia de esperança, desejando que as imagens que saem daquela estúpida caixa não passassem disso mesmo, imagens. E que na realidade, do outro lado tudo fosse diferente. Mas não é. E só me resta tentar ser uma melhor pessoa, tentar ter um existência digna e esperar que os outros tentem o mesmo. LR

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